17 de Maio de 2024
- 2º Grau
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Detalhes
Processo
Órgão Julgador
Publicação
Julgamento
Relator
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Inteiro Teor
IIH&l'\«.ftS.ílST!lH
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
\ V ?í>Í.H^*R*J«Ot>* JS7I TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO
ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA
REGISTRADO (A) SOB Nº
15
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de
Direta de Inconstitucionalidade nº 029637162.2011.8.26.0000, da Comarca de São Paulo, em que é
autor PROCURADOR GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO,
são réus PREFEITO DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS e
PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS.
ACORDAM, em Órgão Especial do Tribunal de Justiça
de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "JULGARAM A
AÇÃO PROCEDENTE . V. U ." , de conformidade com o voto do (a)
Relator (a), que integra este acórdão.
O julgamento teve a participação dos
Desembargadores IVAN SARTORI (Presidente), CORRÊA VIANNA,
LUIZ PANTALEÃO, GONZAGA FRANCESCHINI, DE SANTI RIBEIRO,
XAVIER DE AQUINO, ELLIOT AKEL, ANTÔNIO CARLOS MALHEIROS,
CAUDURO PADIN, RENATO NALINI, KIOITSI CHICUTA, ENIO
ZULIANI, LUÍS SOARES DE MELLO, GRAVA BRAZIL, PAULO DIMAS
MASCARETTI, LUÍS GANZERLA, ITAMAR GAINO, SAMUEL JÚNIOR,
RIBEIRO DA SILVA, URBANO RUIZ, AMADO DE FARIA e MARIA
CRISTINA ZUCCHI.
São Paulo, 1 de agosto de 2012.
PODER JUDICIÁRIO
Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
ÓRGÃO ESPECIAL
Ação Direta de Inconstitucionalidade de Lei nº XXXXX-62.2011.8.26.0000
Requerente: Procurador Geral de Justiça do Estado de São Paulo
Requeridos: Prefeito do Município de São José dos Campos; Presidente da Câmara Municipal de São José dos Campos
VOTO Nº 22293
EMENTA:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI Nº 8.458/11, DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS, QUE PROÍBE A
DIVULGAÇÃO OU EXIBIÇÃO DE QUALQUER TIPO DE MATERIAL
QUE POSSA INDUZIR A CRIANÇA AO COMPORTAMENTO, OPÇÃO OU
ORIENTAÇÃO HOMOAFETIVA - USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA
PRIVATIVA DA UNIÃO - AUSÊNCIA DE INTERESSE LOCAL -SUBTRAÇÃO DA DISCUSSÃO DA MOMOFOBIA DO ÂMBITO ESCOLAR
- CLÁUSULA ABERTA - OFENSA AO PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE -VIOLAÇÃO DOS ARTS. 144, 237, II E VII - DA CONSTITUIÇÃO DO
ESTADO DE SÃO PA ULO -AÇÃO PROCEDENTE.
1. Ainda que inegavelmente seja interesse também do Município o de zelar pela boa educação de seus cidadãos, não há, no que respeita à educação para
a prevenção da homofobia, para o respeito e tolerância da diversidade sexual, e para a discussão sobre a liberdade de orientação sexual, qualquer caractere de preponderância de interesse em seu favor. Inexistindo qualquer
peculiaridade no Município de São José dos Campos envolvendo o tema, temse que ele transcende o interesse local, do que deriva a usurpação de competência legislativa.
2. O debate acerca da homofobia e a educação para o respeito e tolerância do indivíduo homossexual estão calcados na própria Constituição do Estado de São Paulo. As tentativas de se subtrair do âmbito escolar a discussão desta questão social viola o art 237, II e VII, da Constituição do Estado de São Paulo, posto que a educação é dever conjunto do Estado e da família, e não apenas desta.
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3. Ainda que se entendesse como legítima a ratio eleita pelo Legislativo Municipal, qual seja, impedir a veiculação de material que estimulasse determinado comportamento, a lei não traz qualquer delineamento do que seria "material que possa induzir a criança ao homossexualismo". Esse
defeito, longe de ocasionar a ineficácia da norma, termina por ampliar os poderes das autoridades municipais, as quais estariam então autorizadas a
selecionar os livros, informes, vídeos, conteúdos programáticos a serem
ministrados nas escolas municipais, mediante apreciação subjetiva e aberta quanto ao suposto potencial de "induzir ao homossexualismo (sic)". Patente, portanto, a ofensa ao princípio da razoabilidade.
4. Ação procedente.
1. O Procurador-Geral de Justiça do Estado de São Paulo ajuíza ação direta de inconstitucionalidade em face da Lei nº 8.458, de 29 de agosto de 2011, do Município de São José dos Campos, a qual proíbe nas escolas de 1 e 2 graus do Município, a divulgação ou exibição de qualquer tipo de material que possa induzir a criança ao homossexualismo (art 1).
Afirma que o ato normativo impugnado contraria frontalmente a Constituição do Estado de São Paulo. Sustenta que a lei atacada viola os arts. 5 , § 2º; 24, § 2º, "2"; 47, inc. II, XIV, XIX, a; 237, inc. I, II, VII e VIII. Assevera haver violação ao princípio da separação dos poderes, sendo defesa à iniciativa parlamentar a disciplina de atribuições de órgãos do Poder Executivo, assim como do seu funcionamento. Assinala que a lei objurgada impõe comando negativo a órgãos da administração, interferindo na gestão do Poder Executivo, ocorrendo invasão da reserva da Administração. Outrossim, argumenta que o ato normativo afronta o princípio federativo. Nesta esteira, refere-se ao art. 144 da Constituição Bandeirante e afirma que a disciplina do conteúdo daquilo que possa ser veiculado nas atividades escolares é assunto que não se situa no domínio
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normativo periférico de Estados ou Municípios. Destaca que o art 22, inc. XXIV, da Constituição Federal, atribui privativamente à União a competência para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional. Por fim, ressalta que o art. 237 da Constituição Paulista demonstra que a educação, além de ter como meta o preparo da pessoa para a cidadania e como princípio o pluralismo, visa à compreensão dos direitos e deveres da pessoa humana e dos demais grupos que compõem a comunidade, passando pela repulsa a qualquer tratamento desigual ou preconceituoso inclusive por motivo de sexo. Pugna pela concessão de liminar.
o final, pleiteia a declaração de inconstitucionalidade.
Concedida a medida liminar para suspender a eficácia da lei, às fls. 14/15. Citada (fls. 29), a Procuradoria Geral do Estado declinou da defesa do diploma impugnado, às fls. 31/32. Informações do Presidente da Câmara Municipal, às fls. 39/43. Informações do Prefeito do Município às fls. 45/47.
O pedido de procedência foi reiterado pela douta Procuradoria Geral de Justiça às fls. 50/61.
É o relatório.
2. A lei objeto desta ação direta de inconstitucionalidade dispõe, conforme sua ementa, sobre a proibição de divulgação de qualquer tipo de material que possa induzir a criança ao homossexualismo (síc).
A lei se originou do Projeto de Lei nº 280/11 (fls. 76 do apenso), de autoria do vereador Cristóvão Gonçalves, o qual continha, inicialmente, a seguinte redação:
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"Ari. 1 . Fica proibida no município, a divulgação ou exibição de
qualquer tipo de material, que possa induzir a criança ao homossexualismo
(sic).
Art. 2 . O descumprimento da presente lei acarretará ao infrator
multa de R$1.000,00.
Art. 3 . Esta lei entra em vigor na data da sua publicação,
revogadas as disposições em contrário".
Após aprovação na Câmara Municipal (fls. 86 do apenso), o Prefeito do Município apôs veto parcial ao art. 2 da lei (fls. 89/91 do apenso), sancionando-a quanto ao restante e promulgando-a em 29 de agosto de 2011 (fls. 93 do apenso).
A douta Procuradoria Geral de Justiça, requerente da ação, alega que é defeso à lei de iniciativa parlamentar versar sobre atribuição e funcionamento de órgãos do Poder Executivo. Afirma que a lei invade a esfera de competências da Administração Municipal na medida em que impõe comando negativo em matéria de gestão pública. Argumenta que legislar sobre as diretrizes e bases da educação é atribuição privativa da União. Invoca, ainda, o princípio do pluralismo, asseverando que a lei atacada o infringe.
Em suas informações (fls. 39/43), o Presidente da Câmara Municipal aduziu que a lei foi editada após a veiculação de notícia sobre a distribuição pelo Ministério da Educação e Cultura de material destinado ao debate da homofobia nas salas de aula das escolas municipais. Argumentou que a lei partiu do entendimento de que a abordagem deste assunto não seria pertinente no âmbito escolar, mas sim no ambiente familiar. Explicou que os autores da lei pretenderam evitar que a divulgação do material extrapolasse o intuito de evitar a discriminação, passando a fazer apologia ao comportamento homossexual (sic). Por fim, disse que o veto do Prefeito retirou a sanção p
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descumprimento, subsistindo então a lei com caráter meramente educativo, "de
forma a mantê-la como uma advertência para os envolvidos no processo
educacional".
Por sua vez, o Prefeito do Município asseverou o caráter
educativo da norma e afirmou em suas informações (fls. 45/47) que a lei não trata
o homossexualismo (sic) como comportamento inaceitável. Seu objeto é, na
verdade, impedir que a escola influencie na opção sexual das crianças.
Feita a breve digressão, passa-se ao julgamento do mérito.
3. A ação é procedente.
3.1. Os argumentos tecidos nas informações não
preponderam, porque a inexistência de previsão de sanção na lei - decorrente da
aposição de veto ao artigo 2 do projeto de lei, que cominava a multa de RS1.000,00 -, não afasta o controle abstrato de sua constitucionalidade. A
Constituição da Republica e os princípios que dela irradiam sujeitam todas as
normas. E, se assim não fosse, bastaria a qualquer um alegar que determinado
diploma tem cunho meramente educativo, meramente autorizativo, ou de
recomendação, para excetuar-se do controle de constitucionalidade, permitindose violação ao princípio da supremacia constitucional. Igualmente no âmbito
estadual, tendo como parâmetro de controle a Constituição do Estado.
Portanto, apesar de inexistente previsão expressa na lei de
sanção pelo seu descumprimento, está ela sujeito ao controle de
constitucionalidade.
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3.2. A lei foi editada em violação à repartição constitucional de competências legislativas.
Isso porque o Poder Constituinte Originário distribuiu a competência concorrente sobre educação, cultura, ensino e desporto, prevista no art. 24, IX, da Constituição da Republica, apenas à União, aos Estados e ao Distrito Federal. Vale dizer, na esfera municipal a competência legislativa se resolve tão somente nas disposições do art. 30, I e II, da Constituição da Republica.
O inciso I trata da competência para "legislar sobre assuntos de interesse local" e nesse aspecto a evolução da doutrina e da jurisprudência vem apontando critérios para definir essa cláusula aberta. Tem-se firmado, assim, que o interesse local diz respeito às matérias que, porventura, adquiram configurações peculiares em tal ou qual Município, por aplicação do princípio da predominância do interesse. Igualmente, vai se firmando o entendimento de que o interesse local guarda estreita relação com o âmbito territorial. Tudo o que ultrapassar esses dois limites estará, portanto, fora da incidência do inciso I do art. 30.
Sobre o tema, Nelson Nery Costa afirma que "o critério básico de distinção é do interesse predominante, ou seja, frente aos interesses da União ou dos Estados, em determinadas matérias, o interesse municipal deve ter um grau maior de validade, em situações peculiares, como o problema do estacionamento nas ruas do Centro da cidade ou a reforma ou serviços funerários (...). Os 'interesses locais' são aqueles relacionados ao cotidiano da vida municipal, que dizem respeito diretamente
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aos problemas dos vizinhos, sendo predominante a competência do
Município sobre tais matérias" 1 .
Paralelamente, o inciso II do mesmo artigo preceitua que compete aos Municípios "suplementar a legislação federal e a estadual no que couber". Se inexistir lei da União ou do Estado versando sobre um determinado tema, admite-se ao Município legislar nesses limites, desde que presente, também nesse caso, o interesse local. Essa a competência legislativa suplementar.
Alexandre de Moraes, nesse aspecto, explica que "a
Constituição Federal prevê a chamada competência suplementar dosmunicípios, consistente na autorização de regulamentar as normas
legislativas federais ou estaduais, para ajustar sua execução a
peculiaridades locais, sempre em concordância com aquelas e desde que presente o requisito primordial de fixação de competência desse ente federativo: interesse local 2 ".
Uadi Lammêgo Bulos leciona que, "caso a União não regulamente, por meio de normas gerais, as matérias do art. 24 do Texto Maior, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios podem suprir tal inércia legislativa. (...) a municipalidade poderá suprir os vazios e omissões dos legisladores federal e estadual, inclusive quanto aos assuntos dispostos no art. 24. Dois são os requisitos para o exercício dessa especial tarefa de índole federativa: (i) acatamento aos modelos federal (Constituição da República) e estadual (textos constitucionais dos Estados-membros); (ii)
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rigorosa obediência ao principio da predominância do interesse local.
Deveras, apenas as necessidades imediatas do Município (interesses locais)
sujeitam-se ao crivo da competência suplementar, ainda que a satisfação
delas se projete nos planos dos Estados-membros (interesse regional) e até da União (interesse federal). Ora, o poder supletivo, conferido pela Carta de 1988 às municipalidades, não serve de reduto para desvios de competências
ou invasões inconstitucionais de atribuições. Possui um destino certo e incontestável: impedir que a inércia legislativa da União prejudique a vida do Município, paralisando serviços imprescindíveis, tais como transporte
coletivo, polícia das edificações, vigilância sanitária de restaurantes e
similares, coleta de lixo, ordenação e uso do solo urbano, dentre outros
temas que dizem respeito ao interesse local 3".
Seria lícito ao Município regulamentar eventual legislação estadual, conferindo-lhe maior concretude, disciplinando seus pormenores, adaptando a vida prática da Municipalidade aos ditames oriundos de legislação editada pelo Estado de São Paulo em competência suplementar, mas desde que se referisse tão somente à parcela de interesse específico do Município. De forma alguma se admite ao Poder Legislativo Municipal fixar diretrizes amplas, desvinculadas de peculiaridades locais.
Porém, o caso concreto não se subsume a nenhum dos dois incisos, já que o tema não contém qualquer peculiaridade no âmbito municipal. Ainda que inegavelmente seja interesse também do Município o de zelar pela boa educação de seus cidadãos, não há, no que respeita à educação para a prevenção da homofobia, para o respeito e tolerância da diversidade sexual, e para a discussão sobre a liberdade de orientação sexual, qualquer caractere de preponderância de interesse em seu favor. £^
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Portanto, inexistindo qualquer peculiaridade no Município de
São José dos Campos envolvendo o tema, tem-se que ele transcende o interesse
local, do que deriva a usurpação de competência legislativa que acoima a lei de
inconstitucionalidade.
3.3. Além disso, a lei invadiu competência constitucional
privativa da União, qual seja: legislar sobre diretrizes e bases da educação
Conforme aduziu o requerente da ação, "a disciplina do
conteúdo daquilo que possa ser veiculado nas atividades escolares é assunto que
não se situa no domínio normativo periférico de Estados ou Municípios. É tema
que reclama uniformidade e centralidade, possuindo generalidade (...). O assunto
é da pertença das normas gerais reservadas à União porque não admite tratamento atomizado nos demais entes federados" (fls. 60).
3.4. A norma também se apresenta materialmente
incompatível com a Constituição do Estado de São Paulo porque esta, em seu art.
237, elenca os objetivos da educação. E, no inciso VII, prevê expressamente: "a
condenação a qualquer tratamento desigual por motivo de convicção
filosófica, política ou religiosa, bem como a quaisquer preconceitos de
classe, raça ou sexo". O inciso II do mesmo artigo enumera ainda: "o respeito à
dignidade e às liberdades fundamentais da pessoa humana".
Em outras palavras, o debate acerca da homofobia e a
educação para o respeito e tolerância do indivíduo homossexual estão calcados
na própria Constituição do Estado de São Paulo.
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Daí decorre que as tentativas de se subtrair do âmbito escolar a discussão desta questão social viola o art. 237, II e VII, da Constituição do Estado de São Paulo, posto que a educação é dever conjunto do Estado e da família, e não apenas desta.
3.5. Por fim, observe-se que, das justificativas do respectivo projeto (fls. 82 do apenso), se infere que a lei objurgada foi editada pretensamente para impedir o direcionamento da opção sexual da população. Entendeu-se que "a distribuição de material acerca da homofobia seria (...) uma apologia ao homossexualismo".
Entretanto, ainda que se entendesse como legítima a ratio eleita pelo Legislativo Municipal, qual seja, impedir a veiculação de material que estimulasse determinado comportamento, a lei não traz qualquer delineamento do que seria "material que possa induzir a criança ao homossexualismo". Essa observação já havia sido feita pela Assessoria Jurídica da Câmara Municipal (fls. 83 do apenso) no Parecer nº 4051: "Inicialmente há que se apontar que a redação empregada não especifica o que venha a ser o objeto da proibição que se pretende instituir, e não há também parâmetros para se aferir o que possa eventualmente ser um material que possa induzir a criança ao homossexualismo".
Esse defeito, longe de ocasionar a ineficácia da norma, termina por ampliar os poderes das autoridades municipais (sobretudo do Prefeito do Município, mas, possivelmente, também dos vereadores locais), as quais estariam então autorizadas a selecionar os livros, informes, vídeos, conteúdos programáticos a serem ministrados nas escolas municipais, mediante apreciação subjetiva e aberta quanto ao suposto potencial de "induzir ao homossexualismo (sic)".
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Luís Roberto Barroso assevera que ele "expressa uma
incompatibilidade de conteúdo, substantiva, entre a lei ou ato normativo e a
Constituição. Pode traduzir-se no confronto com uma regra constitucional(...) ou com um princípio constitucional". 4
Portanto, há violação também ao princípio da razoabilidade,
incidente por meio do art. 144 da Constituição do Estado de São Paulo.
4. Ante o exposto, julgo procedente a ação.
ARTUWMÂRQ
Relator